
A negação do aspecto cruel através da objetificação absoluta dos animais (são apenas "coisas") é uma das possibilidades de superação da dificuldade desse cenário, mas poucos entre nós de fato apelam para isso. Por "nós" eu quero me referir aqui aos que temos acesso à Internet e visitamos blogs, é claro. Pois bem, nós costumamos ir um pouco além dessa negação, pois sabemos que animais não são coisas, e nós amamos os animais. Nós somos contra os maus-tratos ao leão de cirquinho pobre do interior. Nós não gostamos de rodeio. Nós achamos cafona quem usa casaco de pele. Nós lemos. Nós sabemos a diferença entre Renascimento e Barroco. Nós fazemos terapia. Nós somos sensíveis, inteligentes, críticos. Um degrau acima dos instintos básicos de quem simplesmente curte a apresentação patética do leão maltratado no circo, temos a tarefa bizarra de compatibilizar a responsabilidade pela crueldade indesculpável com os prazeres resultantes dela. E isso apenas para que as coisas fiquem do jeito que estão. Com uma incrível complexidade lançamos mão de toda a arte e toda a ciência para justificarmos simultaneamente nossa crítica à tourada e nosso elogio ao boi na churrasqueira. Isso sim é que é difícil, e acaba se tornando uma verdadeira acrobacia ética, cujos movimentos desenham o que Gary Francione bem definiu como "esquizofrenia moral".
Uma vez que tenhamos algum entendimento do outro e alguma noção de responsabilidade, o dispêndio de energia para manter os velhos hábitos no lugar de sempre a despeito das evidências em contrário vai ficando cada vez maior. Permanecer no mesmo ponto significa continuarmos a depender de práticas cruéis cujos responsáveis somos nós, e essa é realmente uma situação difícil.
Pois então é muito fácil: basta sairmos de onde sempre estivemos.
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